
O Dancehall é um estilo musical popular jamaicano que nasceu no fim dos anos 70. A princípio era um estilo mais escasso e menos político e religioso do reggae do que o estilo das raizes do reggae (Roots) que dominou a maior parte dos anos 70.
Em meados dos anos 80 o instrumental ficou mais digital mudando o som consideravelmente. Com o tempo o dancehall digital (ou o popular "ragga") foi cada vez mais sendo caracterizado por ritmos mais acelerados com pouca conexão com os ritmos do início do reggae. Pelos anos 90, o cruzamento do dancehall com muitos gangsta rap era comum.
O estilo de dancehall moderno também é popularmente conhecido como Bashment.
Começo do Dancehall
O termo Dancehall veio dos espaços onde as sound systems realizavam suas festas e tocavam as gravações populares jamaicanas. Essas festas eram chamadas de "dance halls". Mudanças políticas e sociais no final dos anos 70 na Jamaica se refletiram em um distanciamento do reggae roots mais internacionalizado em vista a um estilo mais orientado ao consumo local. O governo socialista (PNP) foi substituido pelo governo de direita (JLP). Temas de injustiça social, repatriação e Rastafari foram ofuscados por letras sobre festas, violência e sexualidade explícita. Musicalmente antigos ritmos (instrumentais chamados "riddims") do final dos anos 60 foram reciclados, sendo Sugar Minott creditado como o criador dessa tendência quando ele gravou novas letras em riddims antigos do Studio One entre suas sessões de gravação onde trabalhava como músico de estúdio. No mesmo período o produtor Don Mais estava refazendo antigos riddims no Channel One Studios, usando a banda Roots Radics. A banda viria a trabalhar com Henry "Junjo" Lawes em algumas das principais gravações do princípio do dancehall, incluindo algumas que estabeleceram Barrington Levy, Frankie Paul e Junior Reid como grandes astros do reggae. Outros cantores que também emergiram no início da era do dancehall como grandes astros foram Don Carlos, Al Campbell e Triston Palmer, enquanto outros cantores de nomes mais sólidos como Gregory Isaacs e Bunny Wailer se adaptaram ao estilo com sucesso.
As sound systems logo capitalizaram em cima desse novo som, tais como Killimanjaro, Black Scorpio, Gemini Disco, Virgo Hi-Fi, Volcano Hi-Power e Aces International que também apresentaram uma nova onda de deejays (cantores modernos). Os antigos toasters foram ultrapassados por novos astros como Captain Sinbad, Ranking Joe, Clint Eastwood, Lone Ranger, Josey Wales, Charlie Chaplin, General Echo e Yellowman, uma mudança que foi reflexo do álbum "A Whole New Generation of DJs" produzido por Junjo Lawes em 1981, embora muitos deles tenham se inspirado no pioneiro U-Roy. U-Roy, que já animava o pessoal nos bailes em sound systems em 1961, provavelmente foi o primeiro toaster (improvisador de rimas) da história ao cantar sobre versões dub de canções populares remixadas por King Tubby. O jeito de cantar no estilo toasting com o passar do tempo evoluiu para o estilo deejay e, anos mais tarde, gerou o rap norte-americano (através do DJ Kool Herc, entrando em cena então a figura do MC).
As gravações com deejays se tornaram, pela primeira vez, mais importantes do que as gravações com cantores, com os deejays frequentemente gravando em novos riddims antes dos cantores. Um reflexo ao vivo dessa experiência veio mais a frente com os álbums de Sound Clash que traziam deejays rivais e/ou sound systems em uma competição para ser apreciada por um público em algum evento, com fitas k7 que circulavam no meio underground que documentavam a violência que saía dessas rivalidades.
Dois dos maiores deejays do início do dancehall, Yellowman e Eek-a-Mouse, escolheram o humor ao invés da violência e ambos se tornaram grandes astros. Yellowman se tornou o primeiro deejay jamaicano a assinar com uma grande gravadora americana, chegando até a um grau de popularidade na Jamaica no mesmo nível de Bob Marley. O começo dos anos 80 também viu surgir mulheres deejays como Lady Saw, Sister Nancy e Shelly Thunder que trouxeram uma nova dimensão às festas dancehall.
O Dancehall também trouxe à tona uma nova geração de produtores. Junjo Lawes, Linval Thompson, Gussie Clarke e Jah Thomas superaram produtores que tinham dominado a cena no final dos anos 70.
Dancehall digital e Ragga
O hit "(Under Me) Sleng Teng" de Wayne Smith, com um riddim totalmente digital produzido por King Jammy em 1985, levou o reggae dancehall a outro nível. Muitos creditam essa música como sendo o primeiro riddim digital do reggae. Utilizando um teclado Casio MT-40, King Jammy levou o reggae ao dancehall digital, ou a era do ragga. No entanto isso não está muito certo, já que há exemplos de produções digitais feitas antes como o single "Sensi Addict" de Horace Ferguson produzido por Prince Jazzbo em 1984. O riddim "Sleng Teng" é um dos que mais foram gravados e refeitos ao longo dos tempos.
O estilo de cantar dos deejays acompanhado dessa musicalidade mais digital se separou dos conceitos tradicionais da música popular jamaicana. Se nos anos 70 o reggae era vermelho-dourado-verde, na década seguinte se tornou uma corrente de ouro. Foi removido de sua postura roots & culture e houveram vários debates entre puristas que questionavam se aquilo ainda seria considerado como sendo uma extensão da música Reggae.
Essa mudança no estilo novamente viu o surgimento de uma nova geração de artistas, como Shabba Ranks (que se tornou o maior artista de ragga no mundo!), Supercat, Cutty Ranks, Burro Banton. Houve um novo leque de produtores que também se destacaram: Philip "Fatis" Burrell, Dave "Rude Boy" Kelly, George Phang, Hugh "Redman" James, Donovan Germain e Bobby Digital. Wycliffe "Steely" Johnson e Cleveland "Clevie" Brown, aka Steely & Clevie, chegaram a desafiar a posição de Sly & Robbie como os líderes na produção de riddims na Jamaica. Os deejays foram ficando cada vez mais focados em letras de slackness (sexo) e violência. Artistas como Bounty Killer, Cobra, Ninjaman e Buju Banton acabaram se tornando grandes figuras no gênero.
Para acompanhar o som mais pesado dos deejays, surgiu um estilo mais leve de vocal que veio do reggae roots e do R&B, marcado por falsetes e uma entonação quase feminina, como Pinchers, Cocoa Tea, Sanchez, Admiral Tibet, Frankie Paul, Half Pint, Conroy Smith, Courtney Melody, Carl Meeks e Barrington Levy.
No começo dos anos 90 músicas como "No No No" da Dawn Penn, "Mr Loverman" do Shabba Ranks, "Worker Man" da Patra, "Oh Carolina" de Shaggy e "Murder She Wrote" de Chack Demus & Pliers se tornaram alguns dos primeiros super hits de dancehall nos EUA e no mundo. Várias outras variedades de dancehall alcançaram sucesso fora da Jamaica em meados dos anos 90. Tanya Stephens deu um estilo distinto de vocal feminino ao gênero durante os anos 90.
Os anos entre 1990-1994 viram a entrada de artistas como Buju Banton, Bounty Killer, Lady Saw, Shaggy, Diana King, Spragga Benz, Capleton, Beenie Man e uma mudança ainda maior no som do dancehall, trazida pela introdução de uma nova geração de produtores e o fim da produção de riddims tipicamente influenciados pelo controle de Steely & Clevie.
Foi a partir de 1992, com a repercussão internacional à letra considerada homofóbica da música "Boom Bye Bye" de Buju Banton e com a realidade da violência em Kingston (que viram a morte dos deejays Pan Head e Dirtsman), que marcou outra grande mudança no dancehall, desta vez de volta ao Rastafari e aos temas culturais, com diversos artistas de ragga slackness se voltando para a religião. Assim, a cena do ragga consciente foi se tornando um movimento cada vez mais popular. Uma nova geração de "singjays" - cantores na linha mais melódica - e "deejays" surgiu voltando à era do reggae roots, como Garnet Silk, Tony Rebel, Sanchez, Luciano, Anthony B e Sizzla. Artistas como Buju Banton e Capleton, que antes se dedicavam às letras de slackness, se voltaram a escrever mais e mais sobre direitos iguais e justiça. Dessa maneira foi surgindo o reggae new roots, ou seja, o novo reggae roots, seguindo as mesmas tradições dos anos 70 porém com uma pegada mais atualizada, voltada para a nova geração.
Durante os anos 90 o ragga remanesceu firmemente como o som mais popular para os dancehalls Jamaicanos. Começou a incorporar técnicas do hip-hop, e diversos de seus artistas marcaram presença no meio do hiphop nos Estados Unidos; o ragga era também uma influência importante na cena do jungle/drum'n'bass do Reino Unido.
O começo dos anos 2000 viu o sucesso de novos artistas nas paradas musicais, como Elephant Man e Sean Paul. E cada vez mais a cena do dancehall cresceu e vários deejays e singjays foram somando nessa lista de sucesso: Mr Vegas, Lexxus, Red Rat, Baby Cham, Wayne Marshall, Wayne Wonder, Kiprich, Damian Marley, Zumjay, Vybz Kartel, Assassin, Mavado, Idonia, Busy Signal, Gyptian, Demarco... Fora os grupos vocais T.O.K e Ward21, e a safra de cantoras/deejays como Queen Paula, Cecile, Spice, Sasha, Macka Diamond, Timberlee, Tifa, D'Angel, Natalie Storm, Ms Thing entre várias outras.
E o ragga mais voltado para o new roots também cresceu muito, dividindo espaço nas festas com o ragga/dancehall. Embora os temas de ambos na maioria das vezes sejam bem diferentes, vários artistas gravam suas letras em ambos os ritimos - new roots e dancehall hardcore. Artistas jamaicanos mais voltados ao new roots com destaque internacional são Jah Mason, Chuck Fenda, Richie Spice, I Wayne, Turbulence, Fantan Mojah, Lutan Fyah, Junior Kelly, Jah Warrior, Perfect, Chezidek, Determine e a cantora Queen Ifrica, embora muitos outros aparecem a cada dia.
Passos de Dança do Dancehall
A popularidade do dancehall gerou vários passos de dança que ajudam a dar mais vibe nas festas e deixam as performances de palco mais energéticas. Muitos dos passos vistos em videos de hiphop na verdade são variações de passos do dancehall. Várias crews de dançarinos ganham notoriedade ao criar e popularizar esses passos e muitos deejays como Elephant Man e Beenie Man escrevem letras sobre os novos passos de dança que surgem.
Alguns exemplos de passos de dança: "Like Glue", "The Myspace", "The Bogle", "Heel-Toe", "Blazay-Blazay", "Pon the River, Pon the Bank", "Chaka Chaka", "Scooby Doo", "Spongebob", "Signal the Plane", "Hot Fuk", "Tek Weh Yuhself", "Whine Up" (mix de pop, dance, R&B, hip-hop e dancehall), "Boosie Bounce", "Drive By", "Shovel It", "To Di World", "Dutty Wine", "Nuh Linga", "Beyonce Wine", "Gully Creepa".
E a presença das Dancehall Queens executando passos de dança também ajuda a elevar a cena dancehall a outro estágio. Com muita sensualidade em seus trajes, as vezes essas dançarinas podem chegar a beirar a vulgaridade. Sempre vistas com muito profissionalismo nos Concursos onde concorrem a grandes prêmios - e acabam ganhando fama e status - as Dancehall Queens são mais um exemplo dessa Cultura complexa, escrachada e muito divertida. Um fato curioso é que o Japão é um dos poucos países onde algumas Dancehall Queens chegaram a vencer importantes Concursos na Jamaica, se tornando top celebridades no circuito dancehall internacional.
Ragga Internacional
O ragga foi se expandindo além das fronteiras da Jamaica para o resto do Caribe, e acabou aos poucos atingindo outras partes do Planeta. Um dos primeiros deejays brancos a se destacar internacionalmente no estilo no começo dos anos 90 foi o canadense Snow, com seu hit "Informer". Hoje em dia até os branquelos europeus Alborosie (Itália), Gentleman (Alemanha), Million Stylez (Suécia) e Ill Inspecta (Polônia) são sucesso mundial no ragga, cantando em inglês! Já o artista Collie Buddz (Bermudas) é o único cantor branco do Caribe a ter um grande reconhecimento no meio do circuito ragga internacional. E até o judeu Matisyahu (EUA) experimentou um sucesso internacional fazendo ragga.
Hoje em dia o ragga tem uma cena muito forte em países como Itália, França, Japão e Alemanha, onde ocorrem diversos shows internacionais, Soundclashes e grandes festivais dedicados ao gênero. Vários artistas locais também fazem sucesso nesses países cantando em seus idiomas de origem.
Alguns artistas que merecem destaque:
França: Daddy Mory, Lord Kossity, Krys, Yannis Odua, Neg'Marrons, Admiral T, Loo Ranks, Mad Killa, Saël, Tairo
Japão: Ranking Taxi, Ryo the Skywalker, Fireball, Pushim, Homegrown, Mighty Jam Rock, Pang, Munehiro, Megaryu & Lecca, Ichi Bang Boshi Crew
Alemanha: Nosliw, Seeed, D-Flame, Benjie, Tolga, Culcha Candela, Natty Flo, Dr Ring-Ding, Raggabund
O ragga latino - na língua espanhola - surgiu no Panamá com cantores como Nando Boom e El General. Alguns anos depois, através do ritimo Dem Bow, acabou gerando sua versão irmã, o reggaeton. Porém o reggaeton segue uma linha diferente com características próprias, embora ainda se assemelhe bastante ao ragga-dancehall na linha de vocal e na marcação dos beats.
Alguns artistas de nome na cena do ragga de língua espanhola: Kafu Banton, I Nesta, Joc Polo, Bossy D (Panamá) / Morodo, Little Pepe, Daddy Maza, Chulito Camacho (Espanha) / Fidel Nadal, Alika (Argentina) / I Mosa, Oskr-T, Boomer (Chile) / Newton (Rep. Dominicana)
Ragga no Brasil
No território brasileiro o Ragga teve início nas periferias de São Paulo nos anos 90. Alguns pioneiros nesse estilo no Brasil foram toasters paulistas como Pepeu, Frank Frank, Rica Caveman (da banda Nômade), Grupo Kaya e o curitibano Toaster Eddie. E mesmo sem fazer propriamente o estilo ragga, grupos como Defalla, Skank, Planet Hemp e O Rappa deram uma importante contribuição ao mostrar ao grande público alguma idéia do que seria o ragga.
Por aqui o movimento ragga-dancehall vem se fortalecendo cada vez mais e sua popularidade cresceu a partir de 2002, principalmente em São Paulo através da Família 7 Velas. São Paulo vem se tornando a capital do ragga nacional com vários cantores, sound systems e festas dedicadas ao gênero. Já existem alguns nomes que despontam na cena do ragga/dancehall como os cantores paulistas Jimmy Luv, Arcanjo Ras, Sambatuh, Alexandre Cruz, Buyaka San, Pump Killa, além das cantoras Ms. Ivy e Lei di Dai.
O Ragga cada vez mais está conquistando os jovens não só de São Paulo, mas também de todo o país. Fora de São Paulo outros cantores também começam a se destacar na cena como o paraibano Sacal, o mineiro Lord Pow MX, o grupo curitibano Mocambo, os cariocas Sandro Black e Jeru Banto, os goiânos do Ragga Rural e o RaggaDeMente representando no DF.
Se prepare pois o Ragga chegou pra esquentar as pistas e fazer todo mundo se mexer. Pura Vibe!
* alguns hits do ragga/dancehall:
Shabba Ranks - Ting-A-Ling
Bounty Killer - Fed Up
Buju Banton - Champion
Beenie Man - Who Am I
Sean Paul - Temperature
Mr. Vegas - Heads High
Baby Cham - Ghetto Story
Elephant Man - Pon The River, Pon The Bank
TOK - Gal You A Lead
Shaggy - Wild 2 Nite
* alguns hits do ragga/new roots:
Capleton - Jah Jah City
Alborosie - Kingston Town
Damian Marley - Welcome To Jamrock
Sizzla - Solid As A Rock
Chuck Fender - Gash Dem
Fantan Mojah - Hungry
Richie Spice - Youths So Cold
Jah Mason - Princess Gone
Turbulence - Notorious
Queen Ifrica - Genocide
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